Enchentes no Espírito Santo: Uma Preocupação Constante

Por Sabrina Ruela (sabrina@es365.com.br)

O Espírito Santo, um estado repleto de beleza natural e paisagens deslumbrantes que variam do clima de montanha a grandes praias, enfrenta um desafio recorrente: as inundações. Devido às características geográficas e climáticas da região de mata atlântica, especialmente durante a temporada de chuvas, o estado se torna vulnerável a enchentes que podem causar grandes transtornos e danos. As enxurradas muitas vezes resultam em perdas materiais significativas, impactos na infraestrutura das cidades e, em casos extremos, na perda de vidas.

Inundações, como as que afetaram as cidades de Alfredo Chaves, Iconha, Mimoso do Sul, Alegre e Bom Jesus do Norte, que impactaram profundamente na vida das comunidades locais, colocam em risco a saúde e a segurança das pessoas. Sabendo disso, é preciso conhecer as causas, as consequências e as possíveis soluções para esse problema, ouvindo especialistas, autoridades e moradores que vivenciam essa realidade de perto.

Enchente em Mimoso do Sul, 2024 – Foto de Agência Brasil

Uma das características geográficas mais relevantes do Espírito Santo é a presença da Serra do Caparaó, que se estende pelo sudoeste do estado. Esta serra, juntamente com outras cadeias montanhosas, têm grande importância no regime de chuvas da região. As serras atuam como barreiras naturais que induzem a precipitação (chuva) quando as massas de ar úmido vindas do Atlântico colidem com elas. Esse fenômeno, conhecido como chuva orográfica, é uma das principais causas das chuvas intensas no estado capixaba.

Além disso, o Espírito Santo possui vários rios importantes, como o Rio Doce, o Rio Santa Maria da Vitória e o Rio Jucu, que são essenciais para o abastecimento de água, agricultura e navegação. No entanto, esses rios também podem se tornar fontes de problemas durante períodos de chuvas intensas. A bacia hidrográfica do Rio Doce, por exemplo, é extensa e drena uma vasta área, que inclui tanto regiões montanhosas quanto planícies e baixadas. Durante as chuvas, a capacidade de drenagem dos rios pode ser excedida, resultando em transbordamentos e inundações – principalmente nas áreas ribeirinhas.

Outro fator que contribui para a tendência de enchentes é a urbanização desordenada em várias partes do estado, especialmente nas cidades costeiras como Vitória e Vila Velha. A expansão urbana sem planejamento adequado muitas vezes resulta na impermeabilização ou desproteção do solo, retirando a mata nativa e cobrindo com asfalto e betume. Isto diminui a capacidade de absorção de água da chuva, aumentando o escoamento sobre a superfície dos morros e encostas. Esse aumento no escoamento pode sobrecarregar os sistemas de drenagem e provocar enchentes e enxurradas nas áreas urbanas.

Alfredo Chaves

Em janeiro e março de 2020, fortes chuvas e o transbordamento do Rio Benevente, culminaram em enchentes que se tornaram das mais devastadoras já acontecidas na região do município. A precipitação chegou a ultrapassar os 400 mm em algumas áreas; O rio, por sua vez, chegou a 2,20 metros do nível da rua.

Por conta do relevo montanhoso da cidade, a chuva torrencial provocou também deslizamentos de terra. Muitas pontes, estradas e até edificações foram danificadas ou completamente destruídas, dificultando o acesso a algumas áreas.

Enchente em Alfredo Chaves, janeiro de 2020 – Foto da Prefeitura de Alfredo Chaves

Segundo matéria que foi ao ar naquele ano, pela Câmara Municipal de Alfredo Chaves, muito da limpeza urbana para retirada da lama que invadiu as ruas foi feita de maneira voluntária, com mutirões de limpeza organizados por servidores dos órgãos públicos e por cidadãos do município. Da mesma forma, a Secretaria de Assistência Social e a Defesa Civil do Município passaram principalmente por casas das famílias mais atingidas para distribuir cestas básicas, kits de limpezas e itens de quarto como colchões, lençóis e travesseiros.

O prefeito, Dr Fernando Videira Lafayette, à época frisou como é importante a solidariedade da população e, principalmente, dos serviços públicos para reconstruir a cidade em momentos fragilizados: “Não é fácil ver nossa população sofrendo as consequências do pós-chuvas, mas estamos focados em ajudar a todos na medida do possível. Quero registrar a dedicação dos nossos funcionários que estão por conta de normalizar a situação para trazer de volta, a rotina do município. Vamos seguindo com propósito de deixar a cidade bonita e organizada como antes”.

Iconha

Assim como Alfredo Chaves, Iconha também foi atingida por fortes chuvas, que chegaram a cair acima de 300 mm. A cidade de Iconha margeia o rio de mesmo nome, e com as chuvas torrenciais que aconteceram na noite de 17 de Janeiro de 2020, o Rio Iconha se elevou e inundou grande parte da área urbana.

Vários estabelecimentos comerciais, residências, estradas e até mesmo uma ponte, foram seriamente danificados ou destruídos pela força da água. O fator que mais afetou os moradores do município foi a velocidade com que a água subiu, deixando tantos desalojados.

Doações para afetados por enchente em Iconha – Foto de Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Iconha

Somente dois anos depois, em 2022, a cidade estava em condições quase ‘normais’ novamente, após lidar com tantos efeitos colaterais da inundação. O prefeito de Iconha, Gedson Paulino comentou sobre a importância da reconstrução dos locais afetados pelo desastre natural, em especial, a ponte que fora danificada pela enchente. “Agora o trânsito aqui pode ser feito de forma tranquila e segura tanto para os motoristas, quanto para os pedestres. Seguimos trabalhando para levarmos melhorias para nossas comunidades seja no interior ou na cidade”, disse.

Mimoso do Sul

O município de Mimoso do Sul constantemente é afetado por alagamentos de menor e maior gravidade. Nos anos de 2019, 2020, 2021, 2022 e 2023, enchentes de menor gravidade aconteceram na cidade. Apesar dos alertas contínuos da Defesa Civil e do Governo do Estado, não foram feitas nenhuma medida preventiva contra os riscos de desastres naturais no município, até a grande enchente de 2024.

A inundação de 2024, assim como as outras listadas anteriormente foi iniciada com fortes chuvas, que atingiram a região durante vários dias, resultando no transbordamento de rios locais. No entanto, o relevo do município, caracterizado por áreas baixas e encostas íngremes, contribuiu para a rápida acumulação de água e a formação de inundações. Além disso, problemas com desmatamento e a ocupação irregular de áreas de risco contribuíram para a severidade das enchentes.

Moradores tentam recuperar pertences em Mimoso do Sul, 2024 – Foto de Filipe Adrian, Adventistas.org

Em 23 de março de 2024, os danos já eram rigorosos. Segundo a Defesa Civil estadual, a água das enchentes chegou a alcançar o segundo pavimento das casas. Um Casa Lar de Idosos teve que manter os idosos residentes no segundo andar, aguardando busca das equipes de socorro. Situações como essa e repetiram por toda a cidade. A enchente causou danos significativos a residências, comércios, estradas e outras infraestruturas. Pontes e vias importantes ficaram intransitáveis, dificultando o acesso e a mobilidade na região, além de interrupções no fornecimento de serviços essenciais, como eletricidade e abastecimento de água.

Segundo a Defesa Civil do ES, desde o início do desastre, mais de 113 mil itens de ajuda humanitária foram distribuídos para os municípios afetados, incluindo cestas básicas, alimentação, kits de higiene pessoal, colchões, cobertores, ração animal, entre outros, sendo mais de 53 mil itens somente para Mimoso do Sul.

Apesar da reconstrução de infraestrutura crítica ter sido priorizada para restabelecer a normalidade, o município ainda sofre com os efeitos secundários da inundação. A comunidade local e dos entornos se voluntariou para ajudar nas operações de limpeza, distribuição de suprimentos e apoio psicológico às vítimas. A tragédia também incentivou debates sobre a importância da preparação e educação em relação a desastres naturais.

Corpo de Bombeiros

A atuação do Corpo de Bombeiros do ES também se destaca em conjunto com as Defesas Civis. A Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil (Cepdec), órgão do CBMES, atuou no monitoramento das previsões meteorológicas, repassando informações para os municípios. As equipes de pronta resposta foram mobilizadas assim que constatado o volume de chuvas superior ao esperado e seguem atuando até o presente momento.

O Corpo de Bombeiros Militar do Espírito Santo (CBMES) destacou também que a coordenação do serviço de socorro atua conjuntamente com Defesas Civis Municipais e demais órgãos que compõem o Sistema Estadual de Proteção e Defesa Civil, com um plantão 24 horas realizando mapeamento, monitoramento, previsão e alerta de extremos meteorológicos, hidrológicos, geológicos e oceanográficos, como forma de prevenir e mitigar danos e riscos para a população. “Para que esta resposta seja a mais rápida possível em casos de desastres, o Governo do Estado tem investido na estruturação do Sistema Estadual de Proteção e Defesa Civil (Siepdec), que tem como finalidade dotar o Espírito Santo de uma estrutura integrada de planejamento e análise e tomada de decisões antes, durante e após a ocorrência de eventos extremos”, informa a corporação.

Enchente em Mimoso do Sul, 2024 – Foto de Agência Brasil

Atuar para prevenir

A combinação de características geográficas específicas, a presença de rios importantes, a urbanização desordenada e as mudanças climáticas colocam o Espírito Santo em uma posição de vulnerabilidade significativa a enchentes. As autoridades e a comunidade local têm se mobilizado para adotar medidas preventivas e de mitigação, mas o desafio continua a ser grande.

O Governo do Espírito Santo destacou o investimento de mais de R$ 9.000.000,00 (nove milhões de reais) na aquisição de caminhonetes 4×4 e equipamentos Drones entregues aos municípios, permitindo mais qualidade e recursos em vistorias de risco, prevenção e resposta aos desastres.

Por fim, as mudanças climáticas também têm um papel significativo na intensificação dos eventos de chuva extrema. Com o aumento das temperaturas globais, há uma maior incidência de tempestades severas e chuvas concentradas em curtos períodos, elevando o risco de inundações repentinas. Acontecimentos como estes destacam a importância de um planejamento urbano que leve em consideração a vulnerabilidade a desastres naturais, incluindo a criação de sistemas de drenagem eficientes e a preservação de áreas de vegetação.

Além disso, é preciso frisar a necessidade de sistemas de alerta precoce para chuvas intensas e inundações, e preparação dos servidores de serviços de socorro, a fim de reduzir o risco de tragédias futuras.

Enchente em Alfredo Chaves, janeiro de 2020 – Foto da Prefeitura de Alfredo Chaves

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