Revolução Criativa: Economia Circular e Sustentabilidade de Mãos Dadas

Por Sabrina Ruela (sabrina@es365.com.br)

A economia criativa é uma vertente do setor econômico que se baseia na criação, produção e distribuição de bens e serviços que usam a criatividade, o conhecimento popular sustentabilidade e talento como principais recursos. Ela engloba indústrias como artes, design, moda, música, cinema, publicidade, arquitetura, games, gastronomia, turismo cultural, tecnologia, e outras áreas ligadas à inovação. Empreendedores criativos costumam criar negócios que têm, ao mesmo tempo, um impacto econômico e social positivo. Esses negócios podem estar voltados para a preservação do patrimônio natural e cultural ou para o desenvolvimento de soluções que melhoram a vida das comunidades locais de maneira sustentável. A economia criativa e a economia circular são um vislumbre da economia do futuro.

O foco da economia criativa é gerar valor através da criatividade, transformando boas ideias em produtos e serviços. Além disso, ela tem uma forte conexão com a sustentabilidade, pois pode promover o uso responsável de recursos e impulsionar o desenvolvimento social e cultural, além de econômico. Muitas indústrias criativas buscam utilizar materiais recicláveis, reduzir o desperdício e desenvolver processos de produção mais sustentáveis. Por exemplo, no design de moda, o uso de tecidos sustentáveis ou no design de produtos, a adoção de práticas de economia circular.

Em um mundo cada vez mais preocupado com os impactos ambientais e a busca por soluções sustentáveis, a economia criativa surge como um campo inovador e promissor. Ao combinar criatividade, conhecimento e respeito ao meio ambiente, diversos setores estão mostrando que é possível crescer economicamente e, ao mesmo tempo, cuidar do planeta. Mas como as indústrias criativas estão ajudando a moldar um futuro mais sustentável? Essa economia baseada em ideias está promovendo mudanças, criando oportunidades e ajudando a enfrentar os desafios ambientais de forma inovadora e responsável.

Economia e sustentabilidade – Foto de Freepik

ES+Criativo

O governo do Espírito Santo, buscando estimular o crescimento e inovação da economia capixaba, fundou em 2020 o Programa ES+Criativo, para demonstrar com certeza que, mesmo após os anos difíceis da pandemia, o ES ainda tem muito a oferecer – só precisa do incentivo certo. “A intenção é valorizar a criatividade, o capital intelectual e o valor simbólico e cultural do Espírito Santo. Tudo isso é economia criativa. Diversidade cultural, inclusão social, sustentabilidade e inovação são os princípios norteadores do programa ES + CRIATIVO”, diz a Secretaria de Cultura, à qual o Programa está vinculado.

O ES+Criativo busca capacitar profissionais, fomentar o empreendedorismo, além de facilitar o acesso a mercados e o desenvolvimento de produtos e serviços inovadores. O programa também incentiva a sustentabilidade e o uso consciente de recursos, promovendo práticas de economia circular e o uso de tecnologias que reduzem impactos ambientais. Seu objetivo é apoiar e desenvolver talentos, empreendedores e iniciativas em áreas como design, moda, audiovisual, música, artesanato, gastronomia, entre outros setores criativos, através dos pilares de Governança, Pesquisa, Capacitação, Financiamento, Redes de apoio e Hubs de inovação.

Foto de Tomaz Silva, Agência Brasil

Antonio Rocha, diretor de integração do Instituto Jones Santos Neves (IJSN), comenta de forma técnica a respeito do impacto social e ambiental que ações de economia criativa e circular promovem através do Programa: “O Instituto Jones produz desde 2016 o Boletim Economia Criativa, um documento que tem como objetivo acompanhar sistematicamente o desempenho das principais variáveis do mercado de trabalho do segmento Criativo no Espírito Santo, comparando com os demais entes federativos. Por meio deste acompanhamento, realizado trimestralmente é possível avaliar o impacto econômico das atividades criativas. Conforme vimos no último Boletim, referente ao 2º trimestre de 2024, cerca de 220 mil pessoas estavam ocupadas em atividades criativas no Espírito Santo no período, com um rendimento real de R$ 3.465,36”, frisa.

Essas atividades criativas não só incentivam o crescimento econômico, mas também estimulam a diversidade cultural, a inclusão social e o desenvolvimento humano, o que faz da economia criativa um campo dinâmico e em crescimento no mundo globalizado. A economia criativa tem o poder de transmitir mensagens e valores ligados à preservação ambiental e responsabilidade social por meio de arte, cinema, design, música e outras formas culturais. Isso ajuda a conscientizar o público e a influenciar comportamentos em direção à sustentabilidade.

E para a população?

A economia criativa também pode criar novas formas de valorizar a biodiversidade e o meio ambiente, incentivando o turismo sustentável, a gastronomia local com produtos orgânicos e sustentáveis, e outras iniciativas que respeitam o meio ambiente. Designers, arquitetos e artistas estão criando soluções inovadoras que reduzem o desperdício e aproveitam ao máximo os recursos disponíveis. Um exemplo claro desse movimento são os projetos de arquitetura sustentável, que utilizam materiais de demolição ou naturais para criar espaços funcionais e ecologicamente corretos.

Essas iniciativas provam que a economia criativa não é apenas uma força econômica, mas também uma ferramenta poderosa na construção de um futuro mais sustentável. Ao aplicar os princípios da economia circular, as indústrias criativas estão criando novas formas de pensar o consumo e a produção, promovendo mudanças profundas tanto no mercado quanto no comportamento dos consumidores.

Foto de Tomaz Silva, Agência Brasil

Luiz Fernando Schettino, ambientalista e doutor em ciência florestal, comentou sobre a importância da economia criativa e circular, em entrevista para o portal ES365:

PORTAL ES365: Você acredita que os setores culturais e criativos podem influenciar mudanças comportamentais em relação à consciência ambiental?

Schettino: Os setores culturais criativos são fantásticos, pois eles não só influenciam o comportamento, mas podem aumentar a consciência ambiental, “ditando a moda”. Os setores culturais criativos são fundamentais na construção de um modelo sustentável, de uma economia circular e sustentável, porque, sem envolver a questão cultural, educacional, a criatividade como fatores que levem a uma sociedade a ter um conceito novo sobre o consumo e a economia, nós dificilmente conseguiremos avançar rumo à sustentabilidade.

A economia circular e criativa estimula a criação de produtos e serviços que não só são importantes, agradam, mas também tem a pegada ecológica. Então, o fato de serem renovados, reciclados, de serem mais utilizados, é muito importante. A economia circular cria condições para ter uma valorização da cultura; é usando materiais locais, tintas com terras e outros exemplos de uso ecológico, que se mostra de maneira pedagógica como essas ações são importantes para se entender que não é só o artificial que pode ser sustentável, mas que é preciso incluir as tradições, valorizar a questão local, para reduzir o impacto ambiental.

Quando você reutiliza, recicla, restaura materiais, você tem menos poluição, menor quantidade de resíduos, e menos desperdício. Hoje, em exploração de recursos naturais que têm um desperdício enorme (mármore, granito e madeira, por exemplo), é necessário aprender a utilizar os resíduos, e a economia circular pode ajudar muito nisso, até por propor em si, uma vida útil mais longa nos produtos. Essa questão de usar por mais tempo, contrária ao que se faz hoje – o celular tem que ser trocado todo ano, a roupa não dura, etc. – é algo importante a se repensar, ressignificar. Com essas iniciativas, se reduz a pegada de carbono, reduz a necessidade de extrair novos produtos, de utilizar novos produtos; reutilizando, reciclando e ressignificando aquilo que você já tem disponível.

Como o fortalecimento da economia criativa pode contribuir para a redução da pegada de carbono e para a transição para uma economia circular?

Com certeza, é uma abordagem muito forte que vai ajudar a reduzir a pegada de carbono e facilitar a transição energética através de uma economia mais circular. Talvez não 100% circular, mas o mais circular possível. E isso, nós conseguiremos ao trabalhar em todas as linhas: criar produtos, ter designs inovadores, produtos e processos inovadores, uso eficiente da energia. Hoje em dia nós sabemos é possível reduzir os resíduos poluentes com as novas tecnologias, reutilização, reciclagem, tudo dentro de um conceito. É preciso também um design de projetos criativos que incentive as pessoas a reutilizar. Utilização. No Rock in Rio, por exemplo, nós tivemos o aço reciclado. Isso atrai o jovem, ainda mais num evento que atrai tanto a juventude. Imagina só: “Fui no Rock in Rio e estava lá a sustentabilidade, a reciclagem!”; essa é a melhor ferramenta da economia circular.

Rock in Rio – Foto de Divulgação

Que papel a educação ambiental tem no fomento de uma economia criativa mais sustentável?

A educação ambiental é fundamental para se construir um novo entendimento e para reduzir a pegada de carbono. Quando se faz com que as pessoas entendam que a sustentabilidade é uma coisa importante e necessária para influenciar o comportamento e as escolhas de consumo, isso influencia novas iniciativas desde as pequenas comunidades. A educação ambiental torna-se uma ferramenta inovadora para estimular um pensamento crítico, capacitando as pessoas a desenvolverem soluções criativas cada vez maiores para as questões ambientais e sociais, com um forte viés de inclusão social. À medida que a gente inclui as pessoas, diminui as diferenças econômicas, as diferenças sociais, nós geramos mais pessoas com condições e capacidade de contribuir na construção da sustentabilidade.

A educação ambiental é peça chave para se promover uma compreensão melhor, uma aplicação dos princípios da economia circular e para que as pessoas saibam que fazer para construir a sustentabilidade. É fundamental para promover a reutilização, a reciclagem e a diminuição de resíduos. Com iniciativas partido diretamente das comunidades, logo surguirão projetos de reuso de matérias-primas, mas sem deixar de ter geração de emprego, de ter geração de renda.

Desperdício e sustentabilidade – Foto de Alex Fu

Na boca (e nas mãos) do povo

No Brasil, a economia criativa está ganhando força com iniciativas que visam impulsionar o talento e a inovação de forma sustentável. Um exemplo real dessa transformação é o Programa Nacional de Fomento à Economia Criativa. O programa incentiva diversos setores, como design, moda, artesanato e tecnologia, a desenvolverem soluções que aliam criatividade e sustentabilidade. No Espírito Santo, projetos financiados por esse programa têm mostrado como é possível crescer economicamente sem abrir mão da responsabilidade ambiental.

Um caso de destaque é o Inova Moda Digital, iniciativa do SEBRAE Nacional e SENAI CETIQT, que promove a sustentabilidade na indústria da moda capixaba. Segundo o projeto, o Inova tem a missão de “capacitar pequenos empreendedores, microempreendedores individuais (MEI), microempresas e empresas de pequeno porte do segmento têxtil, com o principal objetivo de produzir, disponibilizar e democratizar conhecimento teórico, tecnológico e mercadológico, promovendo o acesso às mais recentes pesquisas de tendências incentiva designers e marcas a adotarem práticas como o uso de tecidos ecológicos, a redução do desperdício de materiais e a criação de coleções atemporais, minimizando o impacto ambiental da produção têxtil”. Além da moda, outros setores criativos, como o artesanato, têm se beneficiado do programa. Esses exemplos provam que a economia criativa não só gera emprego e renda, mas também promove um desenvolvimento mais consciente e alinhado aos desafios ambientais da atualidade.

A economia criativa e circular não depende apenas de grandes empresas ou políticas públicas. A verdadeira transformação ocorre quando pessoas e pequenos empreendedores decidem colocar suas ideias em prática, apostando na criatividade e na sustentabilidade como pilares de seus negócios. Seja um designer que usa materiais reciclados, um artesão que valoriza os recursos locais ou um estilista que propõe uma moda mais consciente, cada iniciativa tem o poder de gerar impacto positivo.

Programas como o ES+Criativo são fundamentais para impulsionar esses talentos e conectar criadores a oportunidades de crescimento. No entanto, o papel da iniciativa pessoal é o que realmente faz a diferença. Cada pessoa que decide inovar de maneira sustentável contribui para um futuro mais responsável, tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental. Afinal, a criatividade pode ser uma ferramenta poderosa para resolver os problemas que enfrentamos hoje.

A economia criativa e circular, com seu potencial de gerar emprego, preservar o meio ambiente e transformar comunidades, é uma prova de que a inovação começa com a vontade de fazer diferente.

Foto de Cris Rosa Gonzales

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