A falha na fronteira verde: O que falta no combate ao desmatamento no Espírito Santo?

Por Sabrina Ruela (sabrina@es365.com)

O Espírito Santo, com vastas áreas de Mata Atlântica preservada e biodiversidade presente em muitos dos parques e áreas de preservação ambiental, se destaca como um ator importante no cenário ambiental brasileiro. Em busca de cumprir as metas de neutralidade de carbono até 2050, o estado conta com o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) na implementação das políticas ambientais; entre as iniciativas mais divulgadas estão o Programa Estadual de Monitoramento e Combate ao Desmatamento Ilegal e o selo verde, ambos com o objetivo de combater o desmatamento ilegal e promover práticas sustentáveis.

No entanto, a efetividade das ações do Instituto ainda gera dúvidas. Apesar dos anúncios de combate a desmatamentos correntes e dos avanços nas políticas públicas, os resultados práticos não têm sido tão claros quanto se espera. A cobrança da sociedade e de ambientalistas é crescente, já que o estado luta contra desafios como a falta de recursos, burocracia e a morosidade na aplicação das políticas.

Desmatamento em Reserva Legal de Guaçuí – Foto de Governo do ES

O Programa Estadual de Monitoramento e Combate ao Desmatamento Ilegal é uma das principais estratégias do Idaf para reduzir o desmatamento no Espírito Santo. A iniciativa tem como objetivo identificar e coibir o desmatamento de maneira eficiente, utilizando tecnologias como imagens de satélite para monitorar as áreas mais vulneráveis. Entretanto, a falta de fiscalização eficiente, aliada a dificuldades na descentralização de processos, tem prejudicado o combate ao desmatamento ilegal.

Discurso versus Realidade

O desmatamento no Espírito Santo tem implicações diretas nas metas de neutralidade de carbono do estado. De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o estado registrou um aumento no desmatamento nos últimos anos, o que torna ainda mais difícil o cumprimento das metas de redução de emissões. O selo verde, que visa certificar práticas agrícolas e florestais sustentáveis, também é alvo de críticas. Embora o selo tenha sido pensado como uma maneira de incentivar os produtores a adotar técnicas mais sustentáveis, ele permanece pouco acessível para grande parte dos agricultores e carece de um sistema de fiscalização robusto.

O desmatamento nas áreas próximas a unidades de conservação, como o Parque Nacional do Caparaó, também afeta diretamente o sequestro de carbono, já que as regiões de “fronteiras verdes” desempenham um papel importante na absorção de CO₂, e compensação por territórios altamente urbanizado. Com o aumento das queimadas e o avanço do desmatamento, o estado vê suas chances de atingir a neutralidade de carbono ameaçadas, o que levanta a questão de se a atual política de combate ao desmatamento é realmente suficiente.

Fiscalização de transporte madeireiro – Foto de Idaf

Produtores rurais, ambientalistas e moradores das regiões afetadas têm visões distintas sobre o trabalho do Idaf. Para os ambientalistas, a falta de ações contundentes e a lentidão nas fiscalizações são pontos críticos. O doutor em ciência florestal e ambientalista, Luiz Fernando Schettino contou para o ES365 como o Idaf pode e deve contribuir mais ativamente para a proteção dos recursos naturais do Espírito Santo:

ES365: O desmatamento impacta diretamente as metas de neutralidade de carbono do ES. Quais estratégias mais eficazes poderiam ser adotadas para reverter esse quadro?

Schettino: O desmatamento não só impacta as metas de neutralidade de carbono, como expõe o solo, ajuda a perda de água e compromete a biodiversidade. Então é necessário um compromisso muito sério de conscientizar a população e não liberar para desmatamento aquilo que não é extremamente necessário, que hoje é muito pouco, porque nós temos a maior parte do Estado desmatado. O que resta precisa que ser preservado, é necessário que haja uma política rígida de proteção das florestas e não uma política em que qualquer solicitação seja atendida, como já acontece nesse sentido. E os técnicos devem ter a responsabilidade de pensar sempre na lei e em como as florestas hoje são vitais para conter o aquecimento global, para a proteção do solo, da biodiversidade e da água.

Em sua opinião, quais são os principais desafios para a implementação das políticas ambientais no Espírito Santo?

Os principais desafios para as políticas ambientais, não só no Espírito Santo, é que falta conscientização, e as pessoas querem sempre protelar a questão ambiental para o futuro. Só que hoje nós chegamos a um ponto em que toda vez que se protela algo na questão ambiental, se aumenta a distância das soluções para buscar a sustentabilidade. O maior desafio é fazer entender, tanto o meio empresarial, quanto o cidadão, tanto os governantes e quanto a classe política, de que meio ambiente não é moeda de troca de acordos políticos.

Como o Idaf poderia superar a dificuldade de adoção de práticas sustentáveis, especialmente por parte dos monocultores rurais e de grandes empresas?

Não só de grandes produtores que envolva monoculturas ou outras empresas, mas para superar as dificuldades é preciso o que já é tão cobrado: conscientização. Em segundo, cumprir a lei. Depois, ter uma estratégia clara de que a sustentabilidade é prioridade e de que não se fará concessões por qualquer motivo além de que a sustentabilidade não seja o objetivo principal das ações. Então é fundamental que se entenda, sustentabilidade é um bem da sociedade; proteção ao meio ambiente é um direito fundamental do ser humano, não se deve fazer negócio com um direito fundamental. É possível conciliar o desenvolvimento com a proteção ambiental mas cumprindo a lei e cobrando de quem está à frente, ações que precisam ser feitas.

Que mudanças urgentes você acredita que o Idaf deveria implementar para avançar de maneira mais eficaz no combate ao desmatamento?

Tudo que nós já temos nas leis são suficientes para um primeiro momento; o que é necessário é a atitude, o comprometimento e o entendimento da urgência da proteção ambiental, da proteção das florestas, da biodiversidade e dos problemas das mudanças do clima que estão por vir. E aproveito para dizer, o nosso Código Florestal estadual, teve sua última alteração em 2022, segundo o Embrapa, e, de acordo com o Idaf, as alterações mais recentes foram para que se permite exploração de plantio de espécies nativas e exóticas para fins comerciais; Logo, há nele uma lacuna que precisa ser preenchida, tanto num debate com a sociedade como um todo para atualizar o nosso Código Florestal, para que ele esteja em acordo pleno com o Código Federal.

Caminhos para a Eficiência

Diante dos desafios, algumas medidas podem ser tomadas para tornar o Idaf mais eficiente. A adoção de tecnologias mais avançadas, como o uso de drones para monitoramento em tempo real, poderia agilizar as fiscalizações e garantir um combate mais eficaz ao desmatamento ilegal. Além disso, a descentralização dos processos e parcerias mais estreitas com a sociedade civil, incluindo ONGs e universidades, poderiam aumentar a transparência e a eficácia das políticas ambientais.

Comparando com estados vizinhos, como Minas Gerais e Rio de Janeiro, que têm investido também no combate ao desmatamento e na promoção de práticas sustentáveis após os incêndios que acometeram o Brasil em 2024, o Espírito Santo deve adotar uma postura mais proativa, investindo em soluções inovadoras e com maior participação da sociedade. As ações previstas do Código Florestal de 2022 são importantes, mas é necessário superar obstáculos como morosidade, falta de recursos e ineficiência na execução. Somente com uma revisão das estratégias e a adoção de medidas mais eficazes será possível alcançar as metas de neutralidade de carbono e assegurar a preservação das riquezas naturais do estado.

Buscado pelo Portal ES365, o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) não se pronunciou a respeito até o fechamento da matéria.

Mata Atlântica – foto de Governo do ES

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